HERANÇA DE MISÉRIA –
Ivonete Aparecida Alves
Para um mandato
coletivo de mulheres pretas
Eu poderia fazer muitas matérias
Para as redes sociais.
Compor muitas poesias
Escrever músicas
Poetizar melodias.
Mas o cotidiano está seguindo.
Folhas caindo
Outono atrasando a primavera.
Não importa se é nova
era
Para nós mulheres negras
A escravização perdura.
Diplomas acadêmicos
Em ganham moldura!
Paredes inteiras repletas de tarefas:
Limpar, pintar, tirar teias de aranha
Fuligem daquela nova queimada
A mangueira (cara! O vendedor garantiu que não enrola!)
Que nada!
Enrolada.
Mais um nó
Desatando a correria
Da vida
Não existe possibilidade
De pensar em qualquer candidatura
Preta lava
Preta enxuga
Preta cose
Preta cosinha
Preta estuda
Preta cuida das plantas
Preta olha o feijão
Pra não queimar
Preta colhe
Seu tomate sem veneno
Preta corre
Tá na hora de plantar.
A araruta desprezada
Debaixo do pé de bertalha
Gruda gavinhas no chão
Espera uma leira
Mas não espera não!
O guandu seca no pé
Faz música sob as patas de Cilorié.
A cidade poluída
Com a crise de humanidade
Os cães abandonados na cidade
Mais um saco de lixo
Arrastam pra lá e pra cá
Sobras de tudo que é tipo.
Tudo junto e misturado
Apanha aquele coitado
O desatino, de tanto consumo
O mundo que perdeu o rumo.
Uma montanha de embalagens
Uma montanha de dor
Uma montanha de candidaturas
Pra repetir a montanha
Não pra fazer canto de Osanha
Não chega a mim não senhor!
Preta para
Preta rara
Preta fala
Preta chora
Preta lava a face
Respira fundo!
Espera
Toda espera resultante
Toda espera suplicante
Por um fazer militante
Que saiba entender num instante
O quanto o machismo insulta
Um preto sorriso de amor!
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