quarta-feira, 23 de setembro de 2020

 

HERANÇA DE MISÉRIA – Ivonete Aparecida Alves

Para um mandato coletivo de mulheres pretas

 

Eu poderia fazer muitas matérias

Para as redes sociais.

Compor muitas poesias

Escrever músicas

Poetizar melodias.

Mas o cotidiano está seguindo.

Folhas caindo

Outono atrasando a primavera.

 Não importa se é nova era

Para nós mulheres negras

A escravização perdura.

Diplomas acadêmicos

Em ganham moldura!

 

Paredes inteiras repletas de tarefas:

Limpar, pintar, tirar teias de aranha

Fuligem daquela nova queimada

A mangueira (cara! O vendedor garantiu que não enrola!)

Que nada!

Enrolada.

Mais um nó

Desatando a correria

Da vida

Não existe possibilidade

De pensar em qualquer candidatura

Preta lava

Preta enxuga

Preta cose

Preta cosinha

Preta estuda

Preta cuida das plantas

Preta olha o feijão

Pra não queimar

Preta colhe

Seu tomate sem veneno

Preta corre

Tá na hora de plantar.

A araruta desprezada

Debaixo do pé de bertalha

Gruda gavinhas no chão

Espera uma leira

Mas não espera não!

O guandu seca no pé

Faz música sob as patas de Cilorié.

A cidade poluída

Com a crise de humanidade

Os cães abandonados na cidade

Mais um saco de lixo

Arrastam pra lá e pra cá

Sobras de tudo que é tipo.

 

Tudo junto e misturado

Apanha aquele coitado

O desatino, de tanto consumo

O mundo que perdeu o rumo.

 

Uma montanha de embalagens

Uma montanha de dor

Uma montanha de candidaturas

Pra repetir a montanha

Não pra fazer canto de Osanha

Não chega a mim não senhor!

Preta para

Preta rara

Preta fala

Preta chora

Preta lava a face

Respira fundo!

 

Espera

Toda espera resultante

Toda espera suplicante

Por um fazer militante

Que saiba entender num instante

O quanto o machismo insulta

Um preto sorriso de amor!


Quem retira o entulho?
Classifica?
Dispõe de forma adequada?



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