segunda-feira, 5 de outubro de 2020

 

Arte Malunga - Exposição de obras de artes afro – Instalações

Artista responsável: Ivonete Aparecida Alves

Produção cultural: Fabiana Alves

 

Histórico

 

Esta Exposição foi planejada há mais de 4 anos e sua execução começou efetivamente em 2018, com o trabalho intenso na produção de abayomis, para servir como componente na execução das obras de arte.

As obras foram pensadas para respeitar alguns princípios.

 

Princípios

 

Com base na arte ancestral africana e afro-brasileira, as obras foram planejadas para valorizar artistas do Brasil e da diáspora africana, que produziram obras de arte destacando os princípios da afrocentricidade: cultura, religiosidade, ancestralidade, respeito aos elementos da natureza, respeito aos mais velhos e aos mais novos.

Também possui a tônica do reaproveitamento e da reciclagem de matérias. A lógica na observação destes princípios deve-se ao fato da situação de espoliação social que nós, negras e negros sofremos ao longo de décadas, financiando nossas ações e na maioria das vezes tendo nossas manifestações culturais sendo roubadas furtivamente ou mesmo declaradamente, dificultando que o povo negro tenha acesso aos bens culturais de matriz africana e afro-brasileira.

Todo respeito aos povos da terra brasilis, a quem pedimos agô por permitir que o povo negro tenha conseguindo sobreviver aos muitos genocídios aos quais fomos submetidos ao longo dos séculos de escravização.

 

Arte malunga: quem veio antes de nós

 

Inspiração:

Mama Esther Mahlangu – África do Sul (Ndebele)

Mama Esther Mahlangu tem agora mais de 80 anos, ainda produzindo arte Ndebele. Ela enfrentou o regime do apartheid na África do Sul produzindo arte de protesto em capacetes de soldados que tinham morrido no enfrentamento ao cruel sistema sul-africano. Cruel, mas que pôde ser enfrentado porque foi um regime racista declarado, muito diferente do racismo esquisito que existe no Brasil.

Mama Esther reproduz em telas, carros, murais traços geométricos com cores onde se sobressai o azul cobalto, talvez recordação ancestral do lápis-lâzule egpcío. Cores vivas de alto contraste com divisórias em preto, branco e várias formas geométricas encontram caminhos paralelos, por vezes querendo saltar dos suportes onde são desenhadas a mão, sem o uso de nenhum instrumento para medir ou servir como base para os desenhos.

As meninas Ndebele precisam aprender a pintar para serem consideradas mulheres. E aprendem com suas mais velhas a preciosa técnica feminina que passa para outras mais novas. É um exemplo afrocentrado e feminista: as mulheres artistas conseguem sua sobrevivência e respeito. Antes, uma conquista ritualística que declaram publicamente sua boa preparação para o casamento. Agora, uma possibilidade de escolha. Fama. Poder político com base em uma tradição viva.

 http://www.arte.seed.pr.gov.br/modules/galeria/detalhe.php?foto=128&evento=1


Inspiração

El Anatsui – Gana

O ganense El Anatsui iniciou suas pesquisas na produção de arte com base nos símbolos adinkras. Depois de um tempo ele foi em busca das latinhas e com elas começou a produzir peças batidas unidas por pedaços de arame. As latinhas são cortadas em vários formatos. Milhares de pedaços juntam-se na formação de  paineis dos mais variados tamanhos. As latas transformam-se em bagagens, em seres que serpenteam pelo chão, símbolos transformados em tudo.

 https://www.geledes.org.br/a-genial-arte-de-el-anatsui-a-alma-escultorica-da-africa-atemporal/



Artur Bispo do Rosário - Brasil

Um dia Bispo apareceu no mundo. E crescendo foi mudando e mudado o mundo ao seu entorno. Apareceu em Japaratuba, no estado de Aracaju. Região cheia de negres, repleta do mundo indígena, com festejos católicos e sincréticos. Festa pra tudo que é santo.

Viveu, fez arte e foi contar seus feitos na Igreja. Feitos de marinheiro, pugilista que foi parar na Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá – fim da linha para os alienados. Bispo escapavapara bordar seu manto na casa dos ex-patrões: os Leone, onde no quartinho dos fundos começou a bordar seu Manto: afinal era o escolhido de Deus para colocar ordem na Terra.

A colônia Juliano Moreira não fornecia nenhum material para terapia ou produção de arte. Até 1970 Bispo teve que dar seus pulos para conseguir linha, tinta, agulha e aí criou sua arte com os materiais que encontrou: canecas, botas, bacias, desfiava roupas, lençóis e cortinas, obtendo um resultado estético de beleza e encanto.

 https://pt.wikipedia.org/wiki/Bispo_do_Ros%C3%A1rio


Inspiração

Sônia Gomes e seus patuás

Nascida em Caetanópolisem Minas Gerais herdou da cidade de tradição nas tecelagens insdustriais, os materais para compor sua história com as obras em tecidos. Remenda, emenda, costura, borda, tira e acrescenta, torce, retorce e junta materiais que compõem uma estética profundamente diferenciada.

Há telas em arame que desorganizam os patuás gigantes. Há blocos desenhados, bordados, coloridos e partes de roupas que se mostram e outras que escondem o que foram. Agora são outra coisa. Combinam com paredes, com o ar livre, plantas, bichos e montanhas. Foi olhando atentamente a obra de Sônia, lendo sobre sua vida que pude absorver um pouco do que ela produz.

 https://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%B4nia_Gomes


 

Lena Martins e as abayomis

A primeira vez que vi uma boneca abayomi sendo confeccionada foi no COPENE – Congresso Brasileiro de Pesquisadores Negres em Florianópolis, em 2012, por uma quilombola que participou do evento.

Sua destreza em cortar os tecidos e dar nós nas bonecas me deixou intrigada. Eu também levei as nossas bonecas Nzinga para comercializar no encontro.

Muitos anos depois é que fui pesquisar sobre as origens da boneca abayomis: uma romanceada e outra que parte de Lena Martins, criadora da Cooperativa Abayomis e responsável por difundir a estética negra que veio através de suas mãos.

Acompanhei um pouco da polêmica sobre as histórias ajudei a inflamar as discussões publicando uma versão delas na abertura da minha dissertação de mestrado.

A decisão de montar uma ocupação cultural com as abayomis foi se constituindo aos poucos, com a junção de outras pretas ao trabalho no Mocambo. Minha meta de produção foi organizada para a produção de 500 abayomis em um mês. Isto para poder desafiar as outras malungas a produzir 100 e depois 200 abayomis no mês. A fartura de retalhos e as muitas possibilidades na produção é um tributo de muitas outras mulheres negras ao recebimento da graça de ter escolhido Lena Martins para legar ao Brasil a confecção e escolha do nome africano para a boneca.

A origem mais conhecida é do Yorubá (encontro precioso); quando é nome (aquele que traz felicidade) pode ser dado tanto para meninos como para meninas.

Leia mais sobre Lena Martins:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Abayomi


E assista sua entrevista:

https://www.youtube.com/watch?v=8SSuiP48dYg

https://www.youtube.com/watch?v=kFHP0qDs0wg


Pesquisando várias bonecas confeccionadas e outras materializadas aqui no Brasil, eu também fui refazendo várias bonecas e bonecas ancestrais ocorrem para nossas mãos. Somos intermediárias entre projetos e realidade, entre os sonhos de produção que um dia existiu e o que é possível materializar com nossas mãos.




Nesta imagem há bonecas fabricadas por muitas mãos. algumas foram produzidas por mim. O papel que está ao fundo foi reciclado e com fibras naturais, pétalas e o papiro foi aplicado depois.


já abaixo tem dois exemplos de bonecas feitas em Gana, que minha amiga Lia trouxe da Espanha para mim.


Quem foi que confeccionou estas bonecas? Quem criou a estética? de onde veio o uso das fibras de bananeira? é possível patentear uma arte como esta?






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