MÃOS NEGRAS
COM GAIA: PERCURSOS – 2025 – Assis/SP
Ivonete
Aparecida Alves - Artista plástica - Agbá do Mocambo Nzinga
Introdução
A concepção
desta Exposição reflete parte de meu percurso como artista, me forjando através
do contato com minha ancestralidade negra, levando em consideração alguns pressupostos de
trabalho, até chegar na criação da técnica da Kizombagem, gestada no útero de
várias outras artistas negras e também com a semeadura de homens artistas do
Brasil e da diáspora Alkebulana[1].
Para que fique evidente o que é a Kizombagem vou já trazer a definição que
elaborei sobre esta técnica de produção artística, conceituada por mim.
KIZOMBAGEM:
A GÊNESE DE UMA TÉCNICA ARTÍSTICA NO COLETIVO
HISTÓRICO
A base para
a criação dessa técnica artística é o reaproveitamento e a reciclagem de
materiais. Então este histórico está bem articulado com minha história de vida
e também com os locais onde atuei como técnica em agropecuária e como educadora
ambiental. Também defendi uma monografia na Faculdade de Arquitetura, Artes,
Comunicação e Design - Câmpus de Bauru
em 1993, denominada Metodologia da Elaboração de Subsídios para Comunicação em
Agricultura Natural, onde narrei parte do percurso da pesquisa com Educação
Ambiental na Delegacia de Ensino de Garça onde trabalhei de 1989 até 1994.
Parte deste
tempo prestei serviço na Secretaria Estadual do Meio Ambiente, atuando na
Estação Ecológica dos Caetetus (Gália, Lupércio, Alvinlândia) nos anos 1990.
Na antiga Febem como educadora ambiental de 1998 até 2001.
Durante
todos estes anos estive envolvida na criação e recriação de técnicas de
reciclagem, reaproveitamento e de exercícios didáticos para a formação de
professoras. O foco em outras pessoas não envolvidas em instituições e também
artistas em formação, foi um fato desde a criação do Mocambo Nzinga em 2009, já
em Presidente Prudente/SP.
Então quando
fui convidada para participar com artista plástica na criação de obras para uma
Exposição em Presidente Prudente, em 2021, processo chamado Arte Malunga, já
estava experimentando a técnica, ainda não nomeada da kizombagem. Em 2022
escrevi um pequeno texto já nomeando e definindo a técnica com alguns
princípios de elaboração:
“Etapas da
elaboração da kizombagem:
1. Escolher o que elaborar para pensar o
como fazer;
2. Conhecer os procedimentos necessários
para alcançar o resultado estético almejado, usando o máximo possível de
materiais de segundo uso, reaproveitados de peças antigas ou adquiridos em
brechós, lojas de usados, cooperativas de catadores ou cachambagem;
3. Saber quais as receitas que respeitam
todos os princípios da kizomgabem, inclusive se esforçando para criar novas
receitas, à partir de outras experiências artísticas de pessoas negras ou
estudando as técnicas de elaboração de suas obras .
Técnicas
subsidiárias na produção de arte na kizombagem
1. Cola com serragem;
2. Massa colorida de serragem para apliques
diversos;
3. Mistura mágica com papel reciclado;
4. Pintura com elementos da natureza
5. Terras para acabamento;
6. Uso de todo e qualquer material
coletado, sobras de colares, colares já usados e descartados, tecidos, vitrilos,
sementes, miçangas, tecidos recortados, fuxicos, toalhinhas de crochê, pequenas máscaras de inspiração étnica
aplicadas nas obras, ferramentas de orixás e orixás produzidos em tecidos, cerâmica
e/ou papel machê; etc.
Aos poucos o
uso de tecido sobrepujou os outros materiais, porque as Bonecas Abayomis
estiveram presentes na elaboração de quase todas as obras de arte de 2021 e o
fato de possuir exemplos práticos, facilitou o ensino do processo para as
outras malungas do Mocambo Nzinga.
Despojaram
uma grade na caçamba. Obra de arte. Despojaram um arco com uma base sintética.
Obra de arte. Despojaram uma tela enferrujada: base para outra obra de arte.
Foi assim elaborada as 24 obras desta Exposição que ficou em cartaz no quintal
do Mocambo por alguns anos. A estreia da Exposição foi on-line devido à
Pandemia do Covid 19, com uma leitura prévia das obras, produzida por um homem
cego, o que possibilitou a descrição de todas as obras da Exposição com esta assessoria.
ARTE MALUNGA
com despojos
Despojaram
uma grade na caçamba. Obra de arte. Despojaram um arco com uma base sintética.
Obra de arte. Despojaram uma tela enferrujada: base para outra obra de arte.
Obra: A KILO roxo
obra e foto
Ivonete Alves
Esta obra
foi produzida sobre uma tela de janeira encontrada numa caçamba no centro de
Presidente Prudente. Foram utilizadas 140 abayomis, e tecidos cortados e
amarrados no telado. O símbolo adinkra usado foi o Tabono (símbolo da força,
confiança e persistência).
Obra: Fofoo ( fofoo é o nome de uma planta africana, cuja semente tem esta aparência)
Esta obra foi produzida sobre uma moldura de aço encontrada tem muitos anos. Esteve pelo quintal e já serviu de forma para peças em papel-machê. Aqui ela foi preenchida com a tela para galinheiro, presa por tiras de malha. Em seguida foram aplicadas abayomis em torno do contorno do símbolo adinkra. o centro foi preenchido por tiras de malha verde.
O símbolo adinkra Fofoo (símbolo da necessidade de evitar o ciúme e a inveja) foi recortado em
tecido de malha, a nossa malunga Alexandra costurou, preenchi com fibra
sintética e depois apliquei pedaços de uma saia adquirida em um bazar da
pechincha.
As
obras da Exposição Mãos Negras com Gaia: percursos
A Exposição
terá uma estrutura produzida com caixotes de feira reaproveitados, madeirites,
portas reaproveitadas, varais como suporte, mesinhas, carteiras, caixas, etc.
Tambor Bamum
Painel
Kizobamgem 1 (suporte aramado)
Painel
Kizombagem 2 (suporte aramado)
Painel
Kizombagem 3 (suporte aramado)
Máscara
capacete Gueledès (sobre caixote ou mesinha)
Butões para
paletó, sobretudo e pereline (peça em tecido, pode ser esticada com fio
esticado)
Peça de inspiração BWA com pintua de tawás
Obras
produzidas com tinturas naturais
23 paineis
de papel com tintura natural. Obras sobre papel fabriano, gramaturas 160 e 180 (colada
e paredes ou outros suporte verticais)
Obras com
símbolos adinkras
1-
Owo foro adobe; 2. Okodee
MMowere; 3- Nkotimsefo Mpua; 4- Dwenini MMen; 5- Epa; 6 - Ananse Ntontan; 7- Okoko
nan; 8- Fafanto; 9 - Funtummireku denkremmireku; 10 - Adinkra Hene 1 e 2; 11 - Odenkyem; 12 - Sankofa sobre frabiano
açafrão; 13 -Sankofa sobre fabriano grãos de urucu; 14 - 4 sankofas sobre
tintura de angico.
Estudos de
coloração para fundos e obras
Café em pó
com água como solvente
Urucum
semente com água como solvente
Hibiscos em
pó com álcool como solvente (3 folhas)
Café em pó
com álcool como solvente
Açafrão em
pó co álcool como solvente
Gravura
Uma negra
com estilo
Gravura
sobre papel fabriano tingido com café,
açafão e urucum
Instalação
Patuá com
ninho de guaxo – ( pássaro Japiim das costas vermelhas - Cacicus
haemorhous L) - (o ninho do guaxo sob um vaso de barro queimado, colorido
com tawás e com a planta Espada de Yansã mini). Tawás são pedras de pintar
trazidas de Minas Gerais.
patuá com ninho de guaxo - instalação
A cabeça de
Zumbi (raízes, cipós, sementes, pedras, musgo, pano e um tanto de exercícios de
Kizombagem em cascata da cabeça de Zumbi)
Ao lado uma
foto com Zumbi menino inteiro no ano de 2009 na Escola Municipal Vilma Alvarez
Gonçalves em Prudente.
Cartazes das Exposições anteriores presentes nesta Exposição
Afroparque
nós na arte viva – 2024
Ateliê de práticas
artísticas: Xirê, arte feminina africana (alkebulana)
Cartazes didáticos
de formações realizadas pela artista:
Matéria da
revista Raça Brasil sobre a criação da boneca Abayomi por Lena Martins.
As
técnicas da Kizombagem
Exercícios
didáticos apresentados em cursos e exercícios didáticos de cursistas.
[1]
Alkebulan é o nome genérico do
continente africano antes da invasão europeia e da europa subdesenvolver e
explorar as pessoas e roubar a riqueza do continente, inclusive o status de
humano que o processo escravizatório constituiu e continua alimentando sua
existência.